Após o Ministério Público da Bahia (MP-BA) recomendar a publicação dos critérios para o retorno das aulas presenciais, a prefeitura de Salvador e o governo do estado estabeleceram as medidas para que a educação volte presencialmente na capital e na Bahia. As atividades escolares vão recomeçar quando a taxa de ocupação de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) específica para covid-19 estiver menor ou igual a 75% por cinco dias consecutivos.
Segundo o secretário municipal de educação de Salvador, Marcelo Oliveira, a probabilidade é que esse índice seja atingido em duas semanas na capital baiana. “Minha expectativa é que nessas próximas semanas tenhamos as condições objetivas para o retorno, mas, a data exata, se vai ser 2 de maio ou no dia 17, isso o prefeito vai ter que alinhar com os secretários de saúde do município e do estado e com o governo do estado", explica o secretário.
O retorno das aulas ocorrerá concomitantemente com a vacinação dos professores e trabalhadores da educação. A previsão é que nesta semana se inicie a imunização dessa categoria, a começar pelos que têm entre 55 e 59 anos. Os cinco dias consecutivos com taxa de 75% só começam a valer a partir do início da vacinação desses profissionais. Além disso, há uma margem de erro de 5%, ou seja, a taxa pode estar em 80%, mas, se outros critérios estiverem em baixa, é possível reabrir.
O secretário explica que essa tolerância de até 5% vale desde que o município registre, por três dias consecutivos, pelo menos duas das seguintes condições: estabilidade ou queda na ocupação de leitos exclusivos de UTI covid-19 adultos; na média móvel de novos casos confirmados; na média móvel de casos ativos ou na taxa de transmissão da covid-19 e incremento no percentual de professores vacinados contra covid-19.
Essas mesmas taxas serão acompanhadas por escola e serão monitorados e divulgados pela Secretaria Municipal da Saúde (SMS). “A ideia é ver o impacto da reabertura em cada escola, mas ainda não sabemos exatamente se isso terá significado, porque é um estudo a partir dos resultados, em que vamos testar nossas hipóteses. O que a gente sabe é que a volta às aulas não tem impacto na curva de contágio”, esclarece.
Oliveira reforça que os protocolos sanitários e pedagógicos continuam os mesmos, como já divulgados pelo CORREIO e que todas as 432 unidades escolares municipais já foram adequadas às normas sanitárias. A princípio, não haverá mudança no calendário letivo de 2020/2021.
Critérios
O governo da Bahia detalha que as salas de aula devem ter, no máximo, 50% da capacidade e autorizou 19 cidades a fazerem o retorno semipresencial. No entanto, a Secretaria da Educação do Estado da Bahia (SEC) não tem uma previsão sobre a data de retorno. Atualmente, em Salvador, a taxa está em 77%, segundo dados da Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS), e, na Bahia, em 82%, segundo painel epidemiológico da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab).
Além desses critérios, o município considera o avanço do processo de vacinação da população em geral de Salvador. O documento cita que isso “se constitui em fator de grande relevância para a avaliação da possibilidade de retomada das atividades escolares”. Até o momento, são 477.907 pessoas vacinadas com a primeira dose em Salvador e 150.878 de segunda dose. Esses quantitativos representam 16,5% e 5,2% do total da população, respectivamente.
A prefeitura ainda pontua que as atividades escolares presenciais poderão ser suspensas se, em 14 dias após a reabertura, a taxa de ocupação de leitos de UTI de covid-19 adultos ficar superior a 80%. A escolha para o retorno presencial pelas unidades escolares será facultativa.
Escolas planejam retorno assim que permitido
O Grupo pela Valorização da Educação (GVE), que representa cerca de 60 escolas particulares de Salvador e Lauro de Freitas, deseja a retomada. “Todas as escolas do GVE estão prontas e querendo iniciar logo que seja liberado”, garante o porta-voz do GVE, Wilson Abdon, diretor do Colégio Perfil.
É o caso do Villa Global Education, escola na avenida Paralela e Litoral Norte. Segundo a CEO Viviane Brito, o retorno das aulas será assim que for possível. Até o momento, o ensino tem sido por aulas virtuais. “Vamos voltar imediatamente, porque as crianças e jovens já não aguentam mais e estamos preparados desde julho do ano passado, com toda a equipe formada”, diz Viviane.
Até uma enfermaria específica para casos suspeitos e confirmados de covid-19 a escola criou, para garantir o cumprimento e isolamento dos alunos e colaboradores infectados. O monitoramento dos casos será feito por meio do preenchimento de um questionário diário, obrigatório para que os alunos entrem na unidade. Além disso, um chefe de segurança fará a fiscalização dos espaços do colégio para assegurar o cumprimento dos protocolos sanitários. As aulas presenciais serão facultativas, com até 50% da capacidade da sala, em dias alternados. A adesão dos pais pela modalidade é de 80%.
O Movimento Volta às Aulas Salvador, formado por mais de 500 pais de alunos da capital baiana, também apoia o retorno. “Achamos positivo que os governos estabeleçam os índices epidemiológicos objetivos. Esta cobrança já era feita desde há muito tempo, inclusive com ação judicial em curso especificamente sobre isso, desde março. Os índices trazem previsibilidade nas políticas públicas, e permitem que a sociedade como um todo possa se preparar”, defende um integrante do movimento, o advogado Edgard Freitas.
O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado da Bahia (Sinepe-BA) aprova a publicação dos critérios. “É um avanço, porque era muito frustrante estarmos fazendo investimentos em protocolos e adaptações e não sabermos até que ponto seríamos autorizados a funcionar, então é um ponto balizador muito positivo e demonstra uma transparência das autoridades”, avalia o presidente do Sinepe-BA, Jorge Tadeu Coelho.
Coelho diz que, pelo semestre letivo já estar na metade, já encaminhado para o final, nenhuma escola vinculada ao sindicato demonstrou ainda vontade de retornar presencialmente. O Sinepe não exige que a vacinação dos professores seja feita antes do retorno, mas pontua que deve haver um acompanhamento dos índices em relação à categoria, para não haver uma culpabilização das escolas pelo aumento dos índices de covid-19.
Sindicatos desaprovam retorno antes da vacina
Ao contrário do que defende o Sinepe-BA, o Sindicato dos Professores no Estado da Bahia (Sinpro-BA), desaprova o retorno das aulas presenciais antes da vacinação. “Recebemos com estranhamento, porque, tanto o governador quanto o prefeito disseram que as aulas presenciais só retornam quando houver a imunização da categoria. Somos contrários a essa medida, ela não ajuda o setor a se recuperar e não preserva a vida”, afirma o coordenador-geral do Sinpro-BA, Allysson Mustafa.
Para ele, valeria esperar mais um pouco, para que a vacinação contra a covid-19 avance. “É duro ficar mais de um ano sem aulas presencial, mas quem já segurou a onda até aqui, não é por conta de 30 a 60 dias, período que podemos promover a imunização e dar uma segurança, que a gente deve se apresar”, pontua.
Segundo Mustafa, são cerca de 80 mil professores de escolas privadas na Bahia, além de 150 mil colaboradores. O Sinpro também destaca que não houve diálogo, até agora, com a prefeitura, sobre o retorno das aulas presenciais e, com o governo estadual, só houve uma reunião, no início de 2020.
Já o Sindicato dos Trabalhadores Em Educação do Estado da Bahia (APLB), além de reforçar que só voltará às salas de aula após a vacina, afirmou que se os governos insistirem no retorno presencial, haverá greve da categoria. “Temos uma decisão de 13 mil educadores em que 95% disseram que só voltam com vacina, então se o governo insistir, teremos greve por tempo indeterminado. Não vamos deixar o povo ir para o corredor da morte, não tem como”, argumenta o presidente da APLB, Rui Oliveira.
“Estamos com mais de 100 mortos por dia na Bahia, taxa de ocupação de leitos de UTI em 85% e a tendência é crescer. É muito fácil ficar no palácio e emitir uma decisão dessa, de forma aleatória, sem combinar com ninguém”, assegura Oliveira.
A SMS disse que não é competência do município determinar quem se vacinará ou não. A decisão deve vir do Ministério da Saúde, que passará por um alinhamento com a Comissão Intergestora Bipartite (CIB), e depende ainda do envio das doses do imunizante.
A Sesab reforçou que a CIB autorizou os municípios a vacinar os profissionais de educação, mas que cada município tem um cronograma. A secretaria ainda lembra que devem ser priorizados os grupos pactuados anteriormente, como os idosos acima de 60 anos e pessoas com comorbidades, mas não é obrigatório que as cidades tenham finalizado esta etapa para seguir para a imunização dos professores.
MP espera notificação
O Ministério Público da Bahia (MPBA) disse que ainda não foi oficialmente notificado da definição dos critérios para a retomada das aulas. “É preciso que o município relacione quais as escolas públicas da rede municipal de ensino já sofreram as adaptações necessárias, bem como, a relação atualizada das que ainda necessitam de adaptações, informando, ainda, o prazo estipulado para a conclusão das referidas providências”, ratificou o promotor de Justiça, José Renato Oliva, autor da recomendação.
O promotor esclarece ainda que não recomendou o retorno às aulas, mas sim que se esclareçam os critérios que justificam a manutenção da suspensão das aulas presenciais. Oliva orientou no documento que, após o retorno das atividades presenciais, as secretarias municipais de Educação e de Saúde realizem inspeções sanitárias periódicas por meio da Vigilância Sanitária nas instituições de ensino e encaminhe ao MP os respectivos relatórios das visitas. O MP não retornou os questionamentos sobre a recomendação feita ao governo estadual.